domingo, 5 de setembro de 2010

Os Poderes Administrativos

Os Poderes Administrativos

Para atingir a sua finalidade de forma efetiva e eficiente, a Administração Pública é dotada de algumas prerrogativas que se apresentam na forma de poderes administrativos, considerados como poder-dever, já que devem ser exercidos em benefício da coletividade e aos objetivos à que se dirigem, sendo irrenunciáveis e limitados pela lei.

Todos os poderes são inerentes à Administração Pública de todas as entidades estatais e encerram prerrogativas de autoridade, podendo ser usados isolados ou cumulativamente para a execução do mesmo ato.

Segundo Hely Lopes Meirelles (2007), os poderes podem ser classificados em:

- poder vinculado e discricionário, quanto à liberdade da Administração para a prática de seus atos;

- poder hierárquico e poder disciplinar, quanto ao objetivo de ordenamento da Administração ou à punição dos que à ela se vinculam;

- poder regulamentar, quanto à sua finalidade normativa;

- poder de polícia, quanto aos seus objetivos de contenção dos direitos individuais.

Sinteticamente, passaremos à uma explicação de cada um desses poderes, com exceção do poder disciplinar, que constitui o tema central desse trabalho e será abordado em capítulo próprio.

O poder vinculado é aquele em que a lei regula todos os requisitos e elementos do ato, isto é, o agente público deve se ater ao que determina a lei, sob pena de o ato tornar-se nulo. Há pouca ou nenhuma liberdade de ação do administrador.

Por outro lado, o poder discricionário confere ao administrador a possibilidade de apreciação de determinados aspectos do ato diante do caso concreto, conforme juízo de conveniência, oportunidade e conteúdo, desde que a lei lhe conceda essa faculdade. Não há que ser confundido com poder arbitrário, porque na discricionariedade faz-se necessária a motivação e a fundamentação dos atos praticados pelo agente público.

Não obstante, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, considera que os poderes discricionário e vinculado são atributos de outros poderes da Administração, não existindo como poderes autônomos.

A hierarquia é um dos pressupostos fundamentais para a organização administrativa e constitui-se na “relação de subordinação existente entre os vários órgãos e agentes do Executivo, com a distribuição de funções e a gradação da autoridade de cada um” (MEIRELLES, 2007, p. 121). Dessa relação decorre o Poder Hierárquico, que, por sua vez, originam poderes para a Administração Pública, que conforme Di Pietro (2002), podem ser os de editar atos normativos, o de dar ordens, o de controlar a atividade dos órgãos inferiores podendo anular ou revogar os seus atos, o de aplicar sanções, o de avocar atribuições e o de delegar atribuições que não sejam exclusivas.

O poder regulamentar, também chamado de poder normativo por alguns doutrinadores, é privativo do Chefe do Poder Executivo da União, dos Estados, Municípios e Distrito Federal (art. 84,IV, CF), constituindo na faculdade que este detém de expedir decretos autônomos sobre matéria ainda não disciplinada por lei, desde que seja de sua competência, bem como de explicar a lei para sua correta execução e interpretar as disposições legais.

Por fim, o poder de polícia é a atividade do Estado destinada a condicionar e limitar o uso e gozo de bens, assim como o exercício dos direitos individuais em prol do interesse público ou do próprio Estado. Ademais, o fundamento da Administração Pública para exercer o poder de polícia é o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular. Através desse poder-dever, a Administração Pública detém a atividade dos particulares que sejam contrárias, nocivas ou inconvenientes ao interesse público, que abrange diversos setores, tais como desenvolvimento, segurança, saúde, moral, meio ambiente, propriedade, entre outros.


3 – Poder Disciplinar

O poder disciplinar da Administração Pública consiste no poder de apurar infrações funcionais dos servidores públicos e demais pessoas submetidas à disciplina administrativa, bem como no poder de aplicação de penalidades.

“Podemos, então, conceituar o Direito Disciplinar como sendo o conjunto de princípios e normas que objetivam, através de vários institutos próprios, condicionar e manter a normalidade do Serviço Público”. (COSTA, 1981, p. 3).

Conforme Meirelles (2007, p. 124), “é uma supremacia especial que o Estado exerce sobre todos aqueles que se vinculam à Administração por relações de qualquer natureza, subordinando-se às normas de funcionamento do serviço ou do estabelecimento que passam a integrar definitiva ou transitoriamente”.

Esse poder não deve ser confundido com o poder hierárquico, apesar de relacionar-se a ele. Por meio do poder hierárquico, distribui-se e escalonam-se funções executivas, enquanto que no poder disciplinar a Administração Pública controla o desempenho dessas funções e a conduta interna de seus servidores, aplicando sanções quando necessário.


Com o escopo de garantir a normalidade da atividade funcional dos órgãos públicos, o Estado a par de outros cuidados que toma, adota normas disciplinares para obrigar os servidores a cumprirem os seus deveres. Se o funcionário infringe algum dos seus deveres, será responsabilizado disciplinarmente, sofrendo uma punição cuja natureza depende da gravidade da falta cometida. Quando tal ocorre, invoca-se o regime disciplinar aplicável. (COSTA, 1981, p. 2).

Também não pode ser confundido com as medidas punitivas decorrentes do poder de polícia administrativa e com o poder punitivo do Estado. Tanto o poder de polícia quanto o poder punitivo do Estado possuem finalidade social, por meio de uma aplicação genérica sobre toda a sociedade enquanto que o poder disciplinar só abrange as infrações relacionadas com o serviço.

O poder punitivo do Estado visa a repressão de crimes e contravenções definidas nas leis penais, sendo realizado pelo Poder Judiciário. Todavia, a mesma infração pode ensejar uma punição administrativa e uma punição penal, porque “aquela é sempre um minus em relação à esta. Daí resulta que toda condenação criminal por delito funcional acarreta a punição disciplinar, mas nem toda falta administrativa exige sanção penal.” (MEIRELLEs, 2007, p. 125).

Enquanto o Direito Penal volta suas vistas para a proteção, genérica, da sociedade, o Direito Disciplinar volta as mesmas vistas rigorosas para a proteção da administração pública, aquela e esta afetadas pelo infrator das leis reguladoras da conduta nas respectivas esferas genérica e específica. (LUZ, 1992, p. 80)


4 – A discricionariedade do poder disciplinar

O poder disciplinar também é caracterizado pela discricionariedade em determinados aspectos.

Enquanto no Direito Penal vigora o princípio de que não há crime sem lei especial que o defina, no Direito Disciplinar não há normas rígidas quanto o procedimento a ser seguido. Além disso, o administrador aplicará a sanção que julgar cabível, oportuna e conveniente dentre as que estiverem enumeradas em lei ou regulamento, podendo, para tanto, considerar a natureza, a gravidade da infração e os danos que resultarem para o serviço público.

Assim, existe liberdade do administrador para verificar se foi ou não cometida alguma infração administrativa, inclusive porque a lei se utiliza de expressões amplas e imprecisas para conceituar certas faltas, como, por exemplo “procedimento irregular”, “ineficiência no serviço” e “desapreço na repartição”.

Contudo, apesar dessa discricionariedade, o Estado não pode se omitir na apuração de qualquer falta funcional, tendo essa aplicação da pena disciplinar o caráter de poder-dever. A não apuração pode ser considerada conivência delituosa, e isso é considerado crime contra a Administração Pública.

Todo chefe tem o poder e o dever de punir o subordinado quando este der ensejo, ou, se lhe faltar competência para a aplicação da pena devida, fica na obrigação de levar o fato ao conhecimento da autoridade competente. É o que determina a lei penal (CP, art. 320). (MEIRELLES, 2007, p. 125).

Quanto a esse aspecto, Egberto Maia Luz (1992, p. 166) ainda acrescenta “não deve apenas corresponder ao Estado o direito, de punir, porém, mais do que este, o dever de punir”.


5 – As penas disciplinares

No Direito Administrativo brasileiro, conforme o artigo 127 da Lei 8112/1990, as sanções disciplinares são seis:

•Advertência – consiste em uma advertência por escrito;
•Suspensão – consiste no afastamento do cargo imposto ao funcionário por determinado período de tempo (de um a noventa dias), acarretando em desconto salarial correspondente aos dias de afastamento, entre outros prejuízos;
•Demissão – é a exclusão forçada do servidor do cargo público que ocupava;
•Cassação de aposentadoria ou disponibilidade – a primeira consiste na pena imposta aos servidores inativos quando já aposentados ou quando ainda estavam em efetivo exercício. Já, a segunda é a sanção aplicável ao servidor que deixa de assumir a função no prazo legal.
•Destituição de cargo em comissão – será imposta a funcionário que não ocupe cargo efetivo, quando este incorrer em ilícito, sendo essa pena cominada com a penalidade de suspensão ou de demissão.
•Destituição de função comissionada – essa sanção ainda não pode ser cominada, posto que não existam dispositivos legais que instituam as funções comissionadas.
Todavia, essa classificação de acordo com a gravidade da pena não significa que o superior deva começar pela mais branda até atingir a mais rigorosa, pois a aplicação de uma dessas penas depende da natureza e da gravidade da falta cometida. Dessa forma, a pena será escolhida conforme satisfaça o interesse público e reprima a falta. Nesse momento, está presente o discricionarismo disciplinar. Porém, como bem acentua Meirelles

Isto não significa, entretanto, que o superior hierárquico possa punir arbitrariamente, ou sem se ater a critérios judiciais. [...] O que se quer dizer é que a Administração pode e deve, atendo-se aos princípios gerais do Direito e às normas administrativas específicas do serviço, conceituar a falta cometida, escolher e graduar a pena disciplinar, em face dos dados concretos apurados pelos meios regulares – processos administrativos ou meios sumários -, conforme a maior ou menor gravidade da falta, ou a natureza da pena a ser aplicada. (2007, p. 126)

QUESTÕES SOBRE O TEMA

12ª Questão:

Analise as frases abaixo:

a) o poder disciplinar é considerado discricionário, uma vez que caberá ao superior hierárquico decidir pela punição ou não do servidor público, bem como pela instauração ou não da sindicância/processo administrativo. Todavia, decidindo pela aplicação da pena não lhe será facultado eleger a sanção cabível, uma vez que as leis estatutárias, em geral, são taxativas e inflexíveis a este respeito.

b) as agências reguladoras detêm poder de inovar a ordem jurídica, criando obrigações para as pessoas físicas e jurídicas submetidas à sua fiscalização, independente da existência de lei anterior que fixe o referido dever. É o que se chama poder normativo.

c) os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade são fundamentais para o correto exercício do poder de polícia e do poder disciplinar.

d) o princípio da motivação, assim como da segurança jurídica, assumem importância no processo administrativo.

a) apenas a alternativa A é falsa
b) apenas a alternativa B é falsa
c) apenas as alternativas A e B são falsas
d) apenas as alternativas C e D são falsas

COMENTÁRIOS:
OPÇÃO (A) Incorreta - Uma das caracteristicas da discricionaridade é a opção de escolha entre uma ou outra opção legal para ser aplicada, não obstante, que a autoridade hierárquica opte por uma ou outra sanção.

OPÇÃO (B) Incorreta - As agências reguladoras são autarquias de regime especial que visam regular certas atividades, através de um poder normatizador, não extrapolando as matérias específicas pertinentes a elas, bem como sem contrariar a lei e os princípios constitucionais. Deve ser um instrumento de integração de normas, trabalhando no campo da execução das leis, mediante critérios técnicos e econômicos.Conforme o conceito adotado de função reguladora, percebe-se que a existência do poder normativo é imanente à própria definição da referida atividade desempenhada pelo Estado, conforme atribuição do artigo 174 da Constituição Federal de 1988.

Entretanto, em que pese a necessidade do exercício de função normativa pelas agências reguladoras, como forma de desenvolvimento de função reguladora, o tema da atribuição da competência normativa aos referidos entes suscita inúmeras discussões face ao regime jurídico brasileiro e à sua pretensa inadequação ao modelo regulatório.

Os atos normativos das agências reguladoras não podem ser ilimitados, pois, como manifestação de competência normativa do Poder Executivo que são, não poderão inovar na ordem - impondo responsabilidades e gravames por meio de suas estatuições - e a competência daquelas agências não pode ser mais ampla do que aquela atribuída ao próprio chefe do Poder Executivo.

Assim, o poder de regulação inerente às agências reguladoras deve ser exercido nos moldes das leis instituidoras, de forma a delimitar-lhes os princípios, estabelecer-lhes o alcance, especificando o sentido a ser aplicado em cada caso.

Note-se que as normas das agências reguladoras deverão dispor apenas de questões técnicas, sem criar nada em desconformidade com as leis vigentes e Constituição.

OPÇÃO (C) Correta - A razoabilidade se refere à legitimidade da escolha dos fins em nome dos quais o Estado atuará, e a proporcionalidade verifica se os meios são necessários, adequados e proporcionais aos fins já escolhidos. O Estado deve justificar racionalmente sua atuação, enquadrando-a no conjunto de regras e princípios albergados pela Constituição, com imprescindível derivação do princípio do devido processo, pois o reconhecimento de uma inconstitucionalidade, baseado no princípio da razoabilidade, não necessariamente será fundado em outro dispositivo constitucional.

A proporcionalidade vai mais adiante, indagando se o ato é adequado e necessário à finalidade, ao objetivo, além de verificar, no cotejo entre os bens, direitos ou interesse protegidos e atingidos pela atuação estatal, qual deverá prevalecer no cão concreto, portanto diferentemente da razoabilidade, sempre haverá duas grandezas em relação: bens, direitos ou interesses constitucionalmente consagrados.

OPÇÃO (D) CORRETA - O princípio da motivação determina que a autoridade administrativa deve apresentar as razões que a levaram a tomar uma decisão.

A motivação é uma exigência do Estado de Direito, ao qual é inerente, entre outros direitos dos administrados, o direito a uma decisão fundada, motivada, com explicitação dos motivos.

Sem a explicitação dos motivos torna-se extremamente difícil sindicar, sopesar ou aferir a correção daquilo que foi decidido, por isso, é essencial que se apontem os fatos, as inferências feitas e os fundamentos da decisão.

A falta de motivação no ato discricionário abre a possibilidade de ocorrência de desvio ou abuso de poder, dada a dificuldade ou, mesmo, a impossibilidade de efetivo controle judicial, pois, pela motivação ;e possível aferir a verdadeira intenção do agente.

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